sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Chapeuzinho Amarelo






Era  a Chapeuzinho amarelo.
Amarelada de medo.
Tinha medo de tudo aquela Chapeuzinho.
Já não ria.
Em festa, não aparecia.
Não subia escada nem descia.
Não estava resfriada, mas tossia.
Ouvia conto de fadas e estremecia.
Não brincava mais de nada, nem de amarelinha.
Tinha medo de trovão.
Minhoca, pra ela, era cobra.
E nunca apanhava sol
porque tinha medo de sombra.
Não ia pra fora para não se sujar.
Não tomava sopa pra não ensopar.
Não tomava banho pra não descolar.
Não falava nada pra não engasgar.
Não ficava em pé com medo de cair.
Então vivia parada,
deitada, mas sem dormir,
com medo de pesadelo.



Era a Chapeuzinho Amarelo.


E de todos os medos que tinha,
o medo mais medonho
era o do tal do LOBO.
Um LOBO que nunca se via,
que morava lá pra longe,
do outro lado da montanha,
num buraco da Alemanha,
cheio de teia de aranha,
numa terra estranha,
que vai ver que o tal LOBO
nem existia.
Mesmo assim o Chapeuzinho
tinha cada vez mais medo
do medo do medo do medo
de um dia encontrar um LOBO.
Um LOBO que não existia.

E Chapeuzinho Amarelo,
de tanto pensar em LOBO,
de tanto sonhar com LOBO,
de tanto esperar o LOBO,
um dia topou com ele que era assim:
carão de LOBO,
Olhão de LOBO,
jeitão de LOBO
e principalmente um bocão
tão grande que era capaz
de comer duas avós,
um caçador, rei, princesa,
sete panelas de arroz
e um chapéu de sobremesa.

Mas o engraçado é que,
assim que encontrou o LOBO,
o Chapeuzinho Amarelo
foi perdendo aquele medo,
o medo do medo do medo
de um dia encontrar um LOBO.
Foi passando aquele medo
do medo que tinha do LOBO.
Foi ficando só com um pouco
de medo daquele lobo.
Depois acabou o medo
e ela ficou só com o lobo.

O lobo ficou chateado
de ver aquela menina
olhando para a cara dele,
só que sem o medo dele.
Ficou mesmo envergonhado,
triste, murcho e branco azedo,
porque um lobo, tirado o medo,
é um arremedo de lobo.
É feito um lobo sem pelo. Lobo pelado.

 

O lobo ficou chateado.


E ele gritou: sou um LOBO!
Mas a Chapeuzinho nada.
E ele gritou: sou um LOBO!
Chapeuzinho deu risada.
E ele berrou: EU SOU UM LOBO!!!
Chapeuzinho já meio enjoada,
com vontade de brincar de outra coisa.
Ele então gritou bem forte
aquele seu nome de LOBO
umas vinte e cinco vezes,
que era pro medo ir voltando
e a menininha saber
com quem não estava falando:

LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO- LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO-BO-LO
        
Aí chapeuzinho encheu e disse:
“Pára assim! Agora!Já!
Do jeito que você ta!”
E o lobo parado assim
do jeito que o lobo estava
já  não era mais o LO-BO
Era um BO-LO.
Um bolo de lobo fofo,
tremendo que num pudim,
com medo da Chapeuzim.
Com medo de ser comido
com vela e tudo, inteirim.
LO-                                                -BO

Chapeuzinho não comeu

aquele bolo de lobo,
porque sempre preferiu de chocolate.
Aliás, ela agora come de tudo,
menos sola de sapato.
Não tem mais medo de chuva
nem foge do carrapato.
Cai, levanta, se machuca,
vai a praia, entra no mato,
trepa na árvore rouba a fruta,
depois joga amarelinha
com o primo da vizinha,
com a filha do jornaleiro,
com a sobrinha da madrinha
e o neto do sapateiro.

Mesmo quando está sozinha,
inventa uma brincadeira.
E transforma em companheiro
cada medo que ela tinha:
O raio virou orrái,
a barata é tabará,
a bruxa virou xabru
e o diabo é bodiá.


FIM



Ah, outros companheiros da ChapeuzinhoAmarelo:

            O Gãodra, a Jacoru, o Barão-tu, o Pão Bichôpa e todos os trosmons.
                                       (Autor: Chico Buarque  - Ilustrador: Ziraldo)





Compreensão

1)      Porque esta Chapeuzinho é Amarelo?    
2)      Qual foi a atitude do lobo quando percebeu que a Chapeuzinho Amarelo não tinha mais medo dele?
3)      Retire do texto as palavras que mostram como o lobo ficou ao perceber que a menina não tinha mais medo dele.
4)      O que é arremedo? “Um lobo sem medo é arremedo de lobo.”  Você concorda? Por quê?
5)      Que outras figuras você conhece ou ouviu falar que, sem o medo, são só arremedos?
6)      O lobo da história pode representar nossos medos. Você também acha que falando e enfrentando os nossos medos, nós podemos lidar melhor com eles?
7)      O que é o medo? Consulte o dicionário e escreva .
8)      Você conhece pessoas muito medrosas? Quem ? De que elas têm medo?
9)      Você conhece pessoas que amedrontam os outros? Quem? Por que elas provocam medo?
10)   Você já amedrontou alguém ? Como?
11)   Você tivesse que escolher uma forma de simbolizar o seu maior medo, como o faria?
12)   O medo é sempre negativo, ou não?  Por quê?
13)   Existe o medo que ajuda a preservar  nossa vida. Escreva três exemplos.
14)   Você acha positivo ou negativo uma pessoa esconder que sente medo? Por quê?
15)   Porque a sociedade costuma valorizar as pessoas que dizem que não tem medo de nada?
16)   Os livros infantis, muitas vezes, valorizam os heróis. Como os heróis são caracterizados nas histórias?
17)   Você acredita que reconhecer que está com medo é sinal de covardia? Por quê?
18)   O que devemos fazer quando o medo nos impede de fazer coisas boas e agradáveis?
19)   A nossa vida é repleta de mudanças e devemos tomar muitas decisões importantes, provocando alguns medos. Quais os seus medos relacionados a sua profissão de educador?  O que você pode  e deve fazer para eliminá-los?
20)   Você já conhecia as palavras chapeuzim e inteirim? Procure-as no dicionário.
21)   Por que Chico Buarque  usou estas palavras, em sua opinião?
22)   Coloque os nomes de seus medos no papel.
23)   Inverta as letras das palavras ou troque alguma e veja como ficaram. Ficou engraçado, ou mais assustador?
24)   A partir desses nomes, crie uma história onde os personagens são seus medos.
a.       Quem são?
b.      Quais são suas características físicas?
c.       Dê a elas alguns traços de caráter.
d.      Onde moram? Como é o lugar?
e.       Porque fazem tanto medo?


25) Depois que você escrever, faça um desenho, bem bonito ou bem amedrontador, de suas personagens.
         

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